Em 1911, Ernest Rutherford
sugeriu um modelo de estrutura para o átomo no qual a
massa positiva do átomo estava concentrada numa pequena
região, o núcleo, produzindo ali um campo elétrico
muito intenso. Os elétrons ficariam girando em torno
deste devido à força elétrica de atração,
que faria o papel de força centrípeta. Rutherford
baseou-se nos resultados experimentais de espalhamento de partículas
alfa por folhas muito finas de metal.
Se uma partícula alfa atravessasse o átomo passando
próximo ao núcleo, sentiria o campo eletrostático
de repulsão do núcleo e desviaria fortemente.
Se incidisse frontalmente ao núcleo, seria obrigada a
parar e retornar! Por outro lado, se passasse na região
vazia entre o núcleo e os elétrons ou mesmo na
região onde estes transitavam, não sentiria a
presença de campos elétricos suficientemente intensos
para desviá-la. Apesar de explicar os desvios sofridos
pelas partículas alfa, o modelo de Rutherford não
forneceu informações sobre a distribuição
dos elétrons ao redor do núcleo e, nesse aspecto,
o modelo era insuficiente para explicar a estrutura dos átomos.
Em 1913, Niels Bohr, baseando-se em resultados experimentais
relativos aos espectros de luz emitidos por gases em descargas
elétricas, sugeriu um novo modelo que contemplava a distribuição
dos elétrons. Vamos explorar como ocorreu a construção
do novo modelo.
1.1 Espectros de emissão
de gases monoatômicos
Como mostra a figura 1, uma descarga elétrica luminescente
(que emite luz) pode ser gerada quando um gás à baixa
pressão é submetido a um campo elétrico. Em
meados do século XIX, as descargas elétricas nos gases
rarefeitos eram estudadas nos tubos de Geissler. Os tubos de Geissler
são tubos de vidro nos quais são introduzidos dois
eletrodos e, por uma bomba de vácuo, extrai-se o ar até
que atinja a pressão desejada, ou extrai-se todo o ar e coloca-se
no tubo outro gás, como por exemplo, neônio, argônio,
hidrogênio etc.
A diferença de potencial
entre os eletrodos pode atingir alguns milhares de volts para tubos
de cerca de 30 cm. À medida que diminui a pressão,
a luz emitida apresenta cores que dependem da natureza do gás.
Esse fato foi verificado quando a luz emitida pelo tubo passou a
ser analisada através de espectroscópios. Os espectroscópios
do século XIX (Figura 2) eram constituídos por prismas
dispersores ou redes de difração que separavam as
diferentes cores emitidas pelo gás, isto é, os diferentes
comprimentos de onda emitidos. Ao conjunto de comprimentos de onda
emitidos pelo gás foi dado o nome de espectro de emissão.
Alguns comprimentos de onda não são visíveis,
mas podiam ser registrados em chapas fotográficas.
Figura 2: Esquema do espectroscópio utilizado no séc.
XIX para analisar a luz emitida por descargas elétricas em
gases.
Fonte: adaptado de http://www.ufsm.br/gef/Moderna20.htm.
A figura 3 mostra um espectroscópio utilizado
hoje nos laboratórios de espectroscopia. Uma rede de difração
substitui o prisma. O espectro pode ser projetado numa escala graduada
(figura 4) para que o comprimento de onda de cada linha seja determinado
pela sua posição em relação à
fonte de luz. Para uma medida mais precisa, são utilizados
foto sensores ao longo da escala, que além de medir a posição
da linha, também podem medir sua intensidade.
Diferente de um metal incandescente que emite um espectro
contínuo, gases parcialmente ionizados gerados de descargas
elétricas emitem espectros discretos, isto é, somente
alguns comprimentos de onda são emitidos de modo que a aparência
do espectro observado é um conjunto de linhas. A cada elemento,
no estado atômico, corresponde um espectro de linhas que o
caracteriza, isto é, a localização (comprimento
de onda) e o número de linhas diferem de elemento para elemento.
A figura 5 mostra a configuração de alguns espectros
de emissão de gases monoatômicos, também conhecidos
como espectro de linhas devido a sua forma.
Como cada elemento químico é caracterizado
por um espectro, como se fosse sua impressão digital, vários
espectroscopistas do século XIX passaram a escrever fórmulas
empíricas para determinar os comprimentos de onda das linhas
espectrais dos elementos analisados. A fórmula empírica
para as linhas visíveis do hidrogênio, elemento mais
simples da natureza por possuir Z=1, foi obtida por Johann Jakob
Balmer em 1885. A série de comprimentos de onda calculados
pela fórmula ficou conhecida por Série de Balmer e
a expressão é a seguinte, em angstroms (10-10m):
ou ainda, escrita no formato
Nessa fórmula empírica, é o comprimento
de onda da linha de número n do espectro do hidrogênio,
n é um inteiro igual ou maior que 3 e R é uma constante
conhecida como constante de Rydberg, dada por
A tabela 1 mostra as cores das linhas visíveis
do hidrogênio, o comprimento de onda correspondente e o n
associado a cada linha.
Tabela 1: Parâmetros do espectro visível do
hidrogênio.
Outras séries empíricas foram formuladas
na mesma época para calcular as linhas emitidas na região
do infravermelho e também ultravioleta. São elas:
Não havia uma justificativa física para
essas fórmulas, isto é, não era possível
explicar porque os espectros mudavam tanto de um elemento para outro
e porque seguiam fórmulas com formatos parecidos. Porém,
era consenso que esses resultados eram consequência de uma
estrutura bem definida para o átomo quanto ao comportamento
dos elétrons em seu interior, já que a absorção
e emissão de radiação eletromagnética
deveriam relacionar-se com a movimentação de cargas
elétricas (segundo a teoria
eletromagnética clássica de Maxwell). Na
década de 1910, a teoria de Planck para a radiação
do corpo negro e o Efeito Fotoelétrico eram bem conhecidos
e ambos usavam o conceito de quanta
de energia. Em 1913, Neils Bohr utilizou o conceito de
quanta e os resultados do espectro do hidrogênio para propor
um modelo atômico que contemplava o comportamento do elétron.
Vejamos a proposta de Bohr. (QUANTA..., 2009).
1.2
Modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio: O salto
quântico
O ponto de partida de Bohr foi o modelo de Rutherford, no qual
a massa positiva estava concentrada no núcleo e os elétrons
giravam em torno dele devido à força elétrica,
em qualquer raio, veja figura 6. A equação 1 mostra
a igualdade entre a força centrípeta e a força
elétrica. Pela teoria
eletromagnética clássica de Maxwell, o
elétron acelerado por uma força centrípeta
deveria emitir radiação eletromagnética constantemente,
isto é, perderia energia e consequentemente iria mover-se
em espiral até atingir o núcleo. Então, o átomo
seria instável!. (TEORIA..., 2009).
Figura 6: Elétron executando uma órbita
circular de raio r sob a ação da força elétrica
de atração. Fonte: http://www.fisica.ufs.br/CorpoDocente/egsantana/elecmagnet/movimiento/bohr/bohr.htm
Os resultados experimentais mostravam que as radiações
emitidas tinham um caráter descontínuo com linhas
bem definidas e cujos comprimentos de onda estavam relacionados
a números inteiros n (ver fórmulas empíricas).
Para resolver esse problema, Bohr sugeriu dois postulados:
Postulado 1- Somente são permitidas aquelas
órbitas cujo momento angular do elétron é quantizado,
ou seja, é múltiplo inteiro de h/2p;
n é um número inteiro
que é denominado número quântico, e h
é a constante de Planck, 6.6256 x10-34 Js.
Os raios das órbitas permitidas são:
onde a0 é o raio
de Bohr, o raio da órbita do elétron do átomo
de Hidrogênio (Z=1) em seu estado fundamental
n =1.
A energia total é:
Em uma órbita circular, a energia total E
é a metade da energia potencial.
A equação 5 mostra que a energia
do elétron aumenta com o número quântico n e
a figura 7 mostra alguns estados de energia permitidos em elétron
volt. Note, na equação 5, que se n é muito
grande, a energia tende a zero. Os estados de energia permitidos
foram chamados de estados estacionários.
Postulado 2 - A radiação
eletromagnética é emitida em forma de um fóton
de energia E=h.f somente quando o elétron salta de um estado
estacionário para outro mais interno, sendo a energia irradiada
dada por
onde h é a constante de Planck (6.63 x 10-34
J.s = 4.14 x 10-15 ev.s), f é
a frequência da radiação emitida, Ei
e Ef são energias dos estados
inicial e final.
A partir das equações 4 e 5, podemos calcular a frequência
ou o inverso do comprimento de onda do fóton emitido.
A equação 7 tem a mesma forma das
fórmulas empíricas para as linhas espectrais. Isto
é, as séries espectrais são exatamente transições
do elétron entre níveis estacionários (órbitas
permitidas pelo primeiro postulado) do átomo de hidrogênio.
As linhas da série de Lyman são transições
dos níveis com n maior ou igual a 2 para o nível
1. Transições dos níveis com n maior ou igual
a 3 para o nível 2 fornecem a série de Balmer. A
série de Paschen resulta de transições para
o nível 3 e a de Brackett para o nível 4.
Da equação 7 pode-se mostrar que a constante de
Rydberg, que aparece em todas as fórmulas empíricas,
é dada aproximadamente por
Dessa forma, os postulados de Bohr retiraram
a instabilidade do átomo, já que o elétron
não pode irradiar energia enquanto encontra-se numa órbita
permitida, e ainda explicaram os resultados obtidos para o espectro
do hidrogênio, pois os comprimentos de onda das linhas espectrais
coincidem com os valores previstos pela equação
7.
Vamos estudar um pouco mais o comportamento do elétron
dentro do átomo para entender o espectro. As órbitas
externas do átomo possuem mais energia do que as órbitas
internas. Um átomo absorve energia quando um elétron
é deslocado de uma órbita de menor energia para
uma órbita de maior energia, ou seja, se a energia adequada
atingir o átomo, o elétron salta da órbita
1 para a órbita 2. Neste processo, a energia é absorvida.
Por conseguinte, se um elétron salta da órbita 2
para a órbita 1, há emissão de um fóton
com uma energia E=h.f exatamente igual à
diferença de energia entre os níveis 2 e 1.
Por exemplo, a linha vermelha no espectro atômico do hidrogênio
(Figura 8) é causada por elétrons saltando da terceira
órbita para a segunda órbita. Veja na figura 8 as
outras transições que originam as raias visíveis.
O salto do elétron de um nível para outro ao absorver
ou emitir energia ficou conhecido por salto quântico,
já que o elétron não pode ocupar estados
intermediários entre os dois níveis em questão.
Esse aspecto do modelo de Bohr leva a um comportamento para o
elétron muito diferente do comportamento previsto pela
física clássica para um corpo qualquer que ganha
ou perde energia. Apesar de não conseguir justificar o
que ocorre à partícula-elétron durante o
salto quântico (ela desaparece de um estado e aparece em
outro?) e mesmo prevendo somente o espectro do hidrogênio,
o modelo de Bohr foi considerado válido e foi o ponto de
partida para o estudo detalhado da distribuição
dos elétrons dentro do átomo. Juntamente com a Teoria
de Planck e a Teoria de Einstein para o Efeito Fotoelétrico,
o modelo de Bohr é considerado precursor da Física
Quântica!